sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Amor acalentado

Hoje, ao (re)ver o filme Philadelphia, me deparei com uma das cenas mais marcantes do cinema para mim: Tom Hanks, ao som da ópera interpretada por Maria Callas, chora em um monólogo, onde, ao mesmo tempo em que traduz a ópera para o seu advogado (interpretado por D. Washington), mostra os fantasmas que habitam o seu íntimo. "Eu sou o deus que veio do céu para a Terra, para fazer da Terra um céu"... "Eu sou o amor"...

Esse episódio me lembrou de um fato ocorrido na semana passada em um conhecido meu me disse que teria medo de se relacionar com alguém que fosse soropositivo. "É estranho, é preciso ter muita coragem". Acho deprimente que, em pleno século XXI e no próprio meio gay ainda existam preconceitos assim. É como se um vírus tirasse a pessoalidade de alguém e a resumisse a algo execrável, inassociável.

"Os mais preconceituosos são os próprios gays" já dizia uma amiga minha psicanalista. Não só os gays, mas também os negros, os soropositivos e todos os que se enquadram em minorias. Mas Philadelphia é um filme que se traduz em um grito de liberdade em meio a uma sociedade amplamente opressora. Nele, as personagens "afeminadas", como se diz por aqui, estão no meio de homens gays "machos". Na trama, os gays são retratados enquanto pessoas comuns, dignas e não esteriotipadas. É defendida a diversidade e a prática de qualquer representação pessoal, desde que não agressiva.

É necessário pensar em quanto somos preconceituosos e como refletimos isso em nosso meio. Um vírus não tira a dignidade de ninguém, assim como ninguém se resume ao que faz na cama, entre quatro paredes. Um homem "afeminado" pode refletir algo dentro de cada um de nós, principalmente dentro dos próprios gays. Assumir a homossexualidade nada tem a ver com assumir a sexualidade, o que é difícil e que gera preconceitos arrogantes e egocêntricos.

"Eu sou o amor", dizia a ópera. Nós somos o amor. Mas a que ponto deixamo-lo aflorar? Até que ponto somos nós mesmos?

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Seres inconseqüentes

É interessante o comportamento do brasileiro. Observo, na trajetória da sociedade brasileira a salvaguarda em que a população sempre se colocou frente questões de calamidade pública. Como sempre, assuntos polêmicos como caos aéreo, corrupção (o casoRenan Calheiros e Laranjas), lavagem de dinheiro público e prisão de criminosos mundialmente procurados residentes no Brasil fazem parte do nosso cotidiano, passam bem debaixo dos nossos olhos e nem sequer movemos a íris para ver.
Antes pensava que talvez o povo brasileiro seria reacionário, inerte, inatento à realidade em que está inserido. Mas hoje me caiu uma ficha que me ligou em uma situação mais séria: estaríamos simplesmente acostumados com as trajédias, com a corrupção, com a impunidade a ponto de nem sentir que acontecem? E isso seria um fenômeno só nosso ou mundial? Estaríamos num processo de autismo frente a realidade ou a conjuntura em que vivemos?

"- Foram desviados mais de U$ 1,5 dos cofres públicos em esquemas de lavagem de dinheiro."
"- Ah, foi? Ó! Esse país não tem jeito mesmo... agora me diga, o que aconteceu ontem mesmo em Paraíso Tropical? Será que a Paula e a Taís vão se encontrar frente a frente logo?"

A cura para isso eu não consigo enxergar. Sinceramente, nem acredito mais nela. As relações interpessoais são cada vez mais fulgazes, superficiais e efêmeras frente à tecnologia, à internet... o mundo está rodando mais rápido, somos bombardeados a cada segundo com zilhões de informações e somos obrigados pela coletividade a ser cada vez mais dinâmicos. Onde isso vai parar? A depressão, o "mal do século XX" nem é mais preocupante, pois, já faz parte do cotidiano. Agora, soluções individualistas como propostas em "O Segredo" apontam uma auto-cura para todos os problemas da vida de qualquer pessoa (que tenha o mínimo de instrução e grana para investir... Acho que Dhurkeim adoraria ler O Segredo se estivesse vivo). Bom, segundo teorias correntes, você pode o que quiser. Sim, mas qual o caminho para que você consiga o que quer? Quais serão os ganhos primários e os sacrifícios em suas relações pessoais, quais serão as suas perdas como pessoa e ser humano? Mas tudo que jorra dinheiro é mais importante para a mídia...

Tudo é tão inconseqüente como nossa própria existência...